Muitos anos atrás decidi parar de postar no Facebook e limitei a minha relação com aquele site lá.
Eu já usava o Instagram e era meio obrigado a usar o Whatsapp, que virou padrão de comunicação no Brasil.
Mas o Facebook mesmo, eu nunca nem instalei o aplicativo de celular. Logava sempre em janelas privativas do browser e demorei muito tempo pra replicar (algumas) postagens do Instagram pro Facebook.
Resolvi finalmente escrever um texto explicando porque e propondo aqui umas reflexões.
Como estou publicando este texto também no Facebook eu provavelmente vou ter que entrar mais vezes lá, exatamente o que eu estou evitando de fazer. Mas é isso, a vida é cheia de contradições e para dialogar ou criticar algo às vezes faz mais sentido criticar de dentro.
O problema principal é que o Facebook virou uma máquina de manipulação polÃtica, de difusão de mentiras ("fake news" = mentira. É simples assim).
E agora com o Trump/Elon Musk na presidência dos EUA a coisa vai piorar e muito.
Hoje o oligarca dono do Facebook, o Zuckerberg, deu uma declaração dizendo que não vai mais inibir mentiras. Ele se diz contra a censura. O que significa que vai poder ter propaganda polÃtica de nazismo, de racismo, homofobia, transfobia, a partir de hoje tá tudo liberado!
Enfim, mas vamos para as minhas razões anteriores para para de frequentar aquele boteco lá.
Bom, no inÃcio era o Orkut. A melhor comunidade online que a gente já teve. No Orkut a dinâmica dos encontros era feita a partir das comunidades. Tinha comunidade de tudo: das mais zuêra a la "anão vestido de palhaço mata oito" e "por favor aceite esta manga" à s mais sérias e dedicadas aos discos brasileiros dos anos 70, arte, etc. As pessoas se organizavam em torno de interesses em comum e em tópicos que ficavam publicavam e organizados. Era fácil achar as coisas, ficava tudo registrado.
Não tinha uma timeline pública coletiva, as timelines eram individuais, você ia no perfil da pessoa com quem queria falar e respondia ao post dela. Tinha depoimentos, tinha notas de "sexy", "confiável", etc.
Então veio o Twitter. No Twitter era apenas uma timeline coletiva onde os posts de inÃcio ficavam publicados cronologicamente, cada post na hora que foi publicado, um depois do outro. Você seguia as pessoas e a pessoa seguia você apenas se quisesse. Não eram "amigos", você queria acompanhar alguém e seguia a pessoa. Se a pessoa não quisesse te acompanhar, paciência.
O Facebook chegou e logo copiou essa timeline pública do Twitter. No inÃcio o Facebook também não tinha ela, era só a timeline individual como no Orkut.
Mas daà o Facebook inventou o tal algoritmo.
Ao invés de receber as públicações de todo mundo que você seguia na ordem em que foi publicada, agora era o Facebook que decidia o que ia aparecer.
O misterioso algoritmo manipulava a sua timeline a partir dos seus likes, supostamente a partir dos seus interesses.
Bom, foi aà que eu perdi o interesse no Facebook.
Porque tudo é polÃtica e não existe algoritmo objetivo isento. O algoritmo foi programado e é constantemente reprogramado por um grupo de pessoas que tem sempre uma intenção polÃtica.
Às vezes a intenção é "deixar a polÃtica de fora" o que em si é um intenção polÃtica, porque não existe isenção. Se você se diz isento, você concorda com quem está no poder. Você participa, querendo ou não, esse é o preço de viver em sociedade. Se você não se posiciona e luta contra, você concorda.
E economia também é polÃtica! O dinheiro é uma ideologia em si!
E o algoritmo do Facebook e do Instagram vem sendo criado para radicalizar as pessoas. Pessoas indignadas, com raiva, ficam mais tempo nos sites repostando e divulgando as coisas e com isso o FB/Instagram, a Meta, vende mais propaganda e ganha mais dinheiro a partir de você que está indignado e fazendo mais pessoas ficarem mais tempo aqui, repostando e divulgando as coisas, as causas, etc.
O dinheiro é uma ideologia e a ideologia de aumentar o rendimento da Meta passa por radicalizar as pessoas, etc, etc.
Enfim. Agora é o paradoxo, porque as pessoas vão responder a este post que eu publiquei lá primeiro e eu vou ter que voltar lá, exatamente o que eu não queria.
Enfim, isso estava entalado na minha garganta e eu precisava desabafar com vocês.
Ah sim, porque eu nunca instalei o aplicativo e só entro em janelas privativas do browser? Porque se você instala o aplicativo e fica logado no navegador, o Facebook fica te seguindo por todo lugar na internet pra alimentar o algoritmo dele....
Comecei a ler o primeiro livro da série, O Problema dos Três Corpos, em 31 de março e li em 3 dias na edição brasileira da Suma de Letras.
Os outros dois eu encarei em inglês e terminei em 15 de maio.
Por três meses e meio fiquei vivendo dentro da história e gostei tanto que resolvi escrever algumas das minhas impressões sobre eles.
Se quiser saber mais sobre a história em si, recomendo o post da Sybilla
Essa série de livros do autor chinês é interessante por muitos motivos.
O mais óbvio é porque a história é boa, bem desenvolvida, contém inúmeras ótimas idéias e vai agradar quem gosta de ficção cientÃfica ao estilo do Asimov ou do Clarke: aquele estilo de ficção cientÃfica que se apóia fortemente em questões de desenvolvimento tecnológico fundamentado nas teorias mais avançadas da área.
A caracterização e o desenvolvimento dos personagens acontece mas fica em segundo plano. O lado forte desta série é a evolução da tecnologia ao longo de mais de 400 anos da humanidade, à espera pela invasão por uma espécie muito mais avançada tecnologicamente. Por vezes a narrativa avança décadas ou séculos de um parágrafo para o outro e isto não incomoda, ao contrário, você quer saber mesmo é o que vai acontecer no futuro e na série o futuro chega logo quando é necessário. Outras vezes o autor se foca por muitas e muitas paginas por algo que parece ser inútil mas que ajuda a criar o clima para valorizar aquele ou aquela personagem mais à frente.
Algumas pessoas com quem conversei desanimaram da série (que começa igual ao livro embora seja beeem diferente em muitos detalhes logo depois) na primeira cena que parece ser uma crÃtica à China.
Mas o livro começa igual: a autocrÃtica em relação aos excessos da Revolução Cultural faz parte da narrativa contemporânea da China e é abertamente discutida por lá já faz muito tempo.
A série me fascinou também porque faz muitas referências a outros autores sem mencioná-los diretamente. Tecnologias como o elevador espacial (proposto pelo já citado Arthur C. Clarke) formam uma parte importante da narrativa.Tenho quase certeza que inúmeras outras referências do tipo estão dispersas pelos três livros e minha pouca erudição em ficção cientÃfica não foi capaz de captá-las.
O próprio tÃtulo norte-americano da série de livros também faz uma curiosa referência ao nome em inglês da série de livros do Proust, Em Busca do Tempo Perdido que em inglês ficou Remembrance of Things Past.
Sem fazer referência direta os livros de Cixin Liu também põe em ação uma situação imaginada por Stanislaw Lem que descreve como poderia ser a comunicação entre seres avançados a ponto de conseguirem alterar as próprias leis da fÃsica.
Certamente não por acaso que o nome do sistema de onde vêm os alienÃgenas seja TriSolaris.
Mas ao invés de uma mera comunicação, na série a relação entre civilizações é feita quase sempre em contexto de guerra seja para o ataque ou para defesa.Fiquei pensando que talvez seja por isso mesmo que a série de um escritor chinês tenha feito sucesso no mercado norte-americano. Os Estados Unidos são uma nação com uma enorme cultura militar que permeia a cultura de modo onipresente e não precisa ir muito longe em Hollywood para perceber isto.
A série chinesa descreve uma situação de guerra universal, com civilizações se eliminando umas as outras, uma verdadeira guerra nas estrelas. Para os personagens de Liu, o Universo seria uma Floresta Escura com civilizações sempre à espreita para atacar.
Fico pensando o que Carl Sagan (otimista a ponto de capitanear o envio de uma sonda terrestre gritando para o Universo "Ei, estamos aqui! Somos assim!") teria a dizer sobre essa teoria. É até possÃvel que tenha sido confrontado com essa teoria ainda em vida. Se alguém souber de um texto de Sagan que discorra sobre o assunto, favor avisar pois eu não lembro de ter lido.
Sendo uma série de livros que descreve uma situação de guerra universal, eu provavelmente não teria ficado muito empolgado em ler se soubesse disso antes. Mas a tal guerra descrita na série é muito mais estratégica do que feita de batalhas entre naves, o que torna tudo muito mais interessante e muito pouco óbvio. Certas partes do livro são pura sociologia e antropologia futurista: especulações tanto sobre outras espécies quanto sobre a nossa própria futura civilização terrestre, caso cheguemos lá.
Além do ensaio de Stanislaw Lem, este sensacional hackeamento das leis da fÃsica para fins bélicos por civilizações suficientemente avançadas, a série também me lembrou a tetralogia Ware do escritor Rudy Rucker.
Nesta outra série o autor acompanha cerca de 200 anos de desenvolvimento da tecnologia de robótica, escrevi sobre ela em outro post.
No entanto são livros bastante diferentes. Recomendo ambos e creio ter ficado tão impactado pelos livros de Liu quanto pelos de Rudy Rucker.
Conclusão: é uma série de livros cabeçuda e com questões complexas de ciência avançada. Se você não gosta de acompanhar o desenvolvimento das teorias cientÃficas você provavelmente vai se perder em vários momentos e não vai gostar.
Quando vi esse post no Xwitter
onde aparece um registro de um computador escrevendo o que consegue entender da água da chuva que cai do lado de fora sobre um pedaço de papel,
lembrei de um trabalho que eu fiz em parceria com a Monica Rizzolli https://monicarizzolli.io/main, amiga e artista, em 2002:
Essa performance, Resposta ao Tempo Presente, foi apresentada em três dias seguidos durante o Ciclotaoro - Neo Tao.
Teatro do Centro da Terra, São Paulo, Brasil, durante o I Circuito Petrobrás de Artes Cênicas com curadoria de Ricardo Karman e Renato Cohen em 15,16 e 17 de Novembro de 2002.
A proposta era combinar uma tecnologia de reconhecimento de voz, o Via Voice da IBM, algo bastante novo na época, com uma performance de body-art.
A Monica se cobriu de palavras escritas com jenipapo com a ajuda de performers e assistentes do coletivo NeoTao https://neotao.info e montamos um sistema composto de um microfone sem fio, um desktop com o Via Voice instalado e um programa de Bloco de Notas aberto e um projetor de vÃdeo.
A performance consistia na Monica lendo cartas de amor, pela última vez, antes pôr fogo nelas diante do público.
O sistema de reconhecimento de voz, usado sem nenhum treinamento e portanto bastante errático, captava o que conseguia e escrevia ao vivo o resultado um tanto surrealista da leitura feita pela artista.
Este post é um mero memorial (escrevi menorial num ato falho revelador da pobreza do registro diante de qualquer performance) da performance realizada.
Saudades de ser artista e expôr em espaços prestigiados e fazer exposições coletivas e divertidas com as pessoas amigas artistas que eu tanto conheço.